Pós-estruturalismo

Teoria da Literatura, Terry Eagleton

Para o estruturalismo de Saussure, a langue (diferente da parole, que é a lingua falada) consiste em uma estrutura delimitada de significação, ou seja: a língua forma um sistema fechado, estável, e o significado na linguagem é produto da diferença entre dois significantes. Porém, de fato, o significado é produto de uma complexa interação entre significantes, uma vez que a significação é o subproduto de um jogo potencialmente interminável de significantes, e não um conceito firmemente ligado a um deles. "O significante não nos revela o significado diretamente, como um espelho reproduz uma imagem" (p. 176)

Se o estruturalismo separou o signo do referente, o pós-estruturalismo, por sua vez, separa o significante do significado. Pois a significação não está imediatamente presente em um signo: ela depende daquilo que o signo NÃO É, de modo que tal significação também está ausente nele, de alguma maneira. A significação nunca pode ser facilmente fixada, tratando-se uma constante oscilação de presença e ausência, dispersa ao longo de toda uma cadeia de significantes.

Além disso, a linguagem é um processo temporal. Quando leio uma frase, sua significação ainda está meio que suspensa, como algo ainda a ser materializado. A frase pode chegar ao fim, mas o processo da lingua em si não pode, pois há sempre mais uma significação a ser constatada. "A significação, portanto, nunca é idêntica a si mesma. É resultado de um processo de divisão ou articulação, de signos que só são eles mesmos porque não são outros signos. Trata-se também de algo em suspenso, de um vir a ser." (p. 177)

Os signos são sempre reiteráveis ou reproduzíveis, e essa possibilidade de reprodução faz parte da identidade do signo. Na verdade, é justamente isso que marca a sua identidade: o fato de que um signo sempre pode ser repetido em um contexto diferente, modificando-se assim a sua significação. Ele jamais é perfeitamente idêntico a si mesmo, e é impossível saber qual era o seu contexto "original", ou seja: a linguagem é muito menos estável do que os estruturalistas pensavam. Não se trata apenas de uma estrutura bem definida, demarcada, encerrando unidade simétricas de significantes e significados.

A linguagem passa a se assemelhar mais a uma teia que se estende sem limites, onde há um intercâmbio e circulação constante de elementos, onde nenhum deles é definível e maneira absoluta e onde tudo está relacionado com tudo. Para outras teorias tradicionais da significação, a função dos signos é apenas refletir as experiências interiores ou objetos no mundo real ou descrever a realidade tal como ela é, portanto só serve para a representação da realidade. Mas então o pós-estruturalismo demonstra que não há nada totalmente presente nos signos, e o uso deles sempre implica alguma dispersão das minhas significações, que jamais serão idênticas a si mesmas em todas as ocasiões.

O sujeito, por ser feito de linguagem (mais uma vez, ela não é apenas um instrumento para representar o mundo!), também não deve ser estável; ele deixa de ser uma entidade unificada. E se é necessário usar os signos para examinar minha mente ou minha alma, não é possível ter uma significação ou experiência pura e sem deformações, pois a linguagem não permite isso. A "voz viva", ou seja, os signos falados, é tão material quanto a palavra impressa, e ambas só funcionam por um processo de diferenciação e divisão.

Essa teoria da linguagem pós-estruturalista acaba revelando, assim, que qualquer significação transcendental, como Deus, Eu, substância, matéria, ideia, etc, qualquer conceito que espera fundamentar nosso sistema de pensamento e linguagem – e que por isso deveria estar situado fora desse sistema –, é uma FICÇÃO, mesmo que uma ficção necessária, porque todo conceito está enredado em um jogo aberto de significação.

Tais ideias foram desenvolvidas principalmente por Derrida, que classificou como metafísico qualquer sistema de pensamento dependente de uma base inatacável, de um princípio primeiro de fundamentos inquestionáveis. No entanto, como a própria historia da humanidade está impregnada pelo impulso de criar tais princípios, o autor admite que a sua obra também está contaminada pela metafísica, por mais que procure se livrar dela.

Os princípios sempre podem ser desconstruídos, uma vez que são produtos de um determinado sistema de significações, e não algo que o sustenta de fora pra dentro, sendo a desconstrução a operação crítica através da qual as oposições binárias podem ser parcialmente enfraquecidas. Assim compreende-se que as oposições binárias, com as quais o estruturalismo clássico gosta de trabalhar, representam uma maneira de ver típica das ideologias, p.ex.: o homem, enquanto princípio fundamental numa sociedade patriarcal, é visto como superior, pois a mulher é o não-homem, porém ao mesmo tempo ela o define (ao ser diferente dele), então não constituem uma oposição binária, fato mascarado pela ideologia.

As ideologias traçam fronteiras rígidas entre o que é aceitável e o que não é, entre o eu e o não eu, a verdade e a falsidade, o sentido e o absurdo, a razão e a loucura, central e marginal... Esse pensamento metafísico, porém, não pode ser simplesmente evitado, uma vez que consiste em um hábito binário de pensamento. Mas quando operamos de certa forma sobre os textos (considerados aqui um emaranhado de signos em constante avanço e recuo), é possível revelar um pouco dessas oposições e demonstrar como um termo de uma antítese está presente no outro.

Se o estruturalismo se contentou em separar as oposições binárias em um texto e expor a lógica dessa análise, o pós-estruturalismo, por meio da desconstrução, tentou mostrar como tais oposições por vezes traem a si mesmas para se manter como tais. A tática da crítica desconstrutiva, por meio da qual se trabalha em um fragmento da obra até que ele ameace desmantelar as oposições que governam o texto como um todo, é de demonstrar como os textos podem embaraçar seus próprios sistemas lógicos dominantes. Para isso, a desconstrução toma os aporias ou os impasses de significado nos quais o texto enfrenta problemas, perde a coesão e se abre a contradições.

Essa se trata de uma proposição universal sobre a natureza da escrita: para Derrida, há na própria escrita alguma coisa que pode escapar a todos os sistemas e lógicas. Um oscilar constante, uma contínua difusão e derramamento de significados, chamada por ele de "disseminação", e que não pode ser facilmente contida nas categorias estruturais do texto. Assim, um texto pode nos "mostrar" alguma coisa sobre a natureza da significação que ele mesmo não é capaz de formular como proposição. "Toda a linguagem, para Derrida, encerra esse 'excedente' em relação ao significado exato, está sempre ameaçando ultrapassar e escapar do sentido que tenta limitá-la" (p. 185).

De acordo com a visão saussureana, o significado do signo é sempre uma questão de convenção história e cultural, portanto é arbitrário (p. 187). Uma das funções da ideologia é "naturalizar" a realidade social, fazer com que ela pareça tão inocente e imutável quanto a própria natureza. Para Barthes, a passagem do estruturalismo para o pós-estruturalismo é a passagem da "obra" (como um todo coerente formulado pelo autor) para o "texto" (emaranhado oscilante de signos). 

Na literatura, o poema ou o romance deixam de ser vistos como uma entidade fechada, equipadas de significações definidas, para se tornarem jogos irredutivelmente pluralísticos, intermináveis, de significantes que jamais podem ser apreendidos em torno de um único centro, em uma essência ou significação únicos. O texto está mais para um processo aberto de "estruturação" do que para uma estrutura (p. 191).

Se o estruturalismo surge devido a crise social e linguística do século XIX/XX, o pós-estruturalismo pode ser relacionado ao movimento estudantil de maio de 1968. "O pós-estruturalismo foi produto dessa fusão de euforia e decepção, libertação e dissipação, carnaval e catástrofe, que se verificou no ano de 1968. Incapaz de romper as estruturas do poder estatal, o pós-estruturalismo viu ser possível, em lugar disso, subverter as estruturas da linguagem" (p. 195).

Após o movimento estudantil ser varrido das ruas e levado à ilegalidade, ele chega ao discurso, e seus inimigos agora eram os sistemas de crença coerentes, as formas de teoria e organização políticas que buscavam analisar e agir sobre as estruturas da sociedade como um todo. "O próprio significado conceitual, em oposição ao gesto libidinal e à espontaneidade anarquista, foi temido como repressivo" (p. 196).

O poder estava em toda parte como uma força fluida, volátil, que se infiltrava em todos os poros da sociedade mas não tinha mais centro do que o texto literário. O "sistema como um todo" não podia ser combatido, porque não havia na realidade nenhum "sistema como um todo" (p. 196). Porém a "estrutura total" identificada como inimigo pelos estudantes era historicamente específica: era o Estado armado e repressivo da fase moderna do capitalismo monopolista, e a política stalinista que pretendia enfrentá-lo, mas no fundo era cúmplice do seu domínio. Os estudantes, fossem eles anarquistas ou socialistas, criticavam essa política. A escrita virou uma fuga, um espaço de liberdade.

E as noções clássicas de verdade, realidade, significado e conhecimento foram denunciadas como baseadas numa teoria representativa da linguagem. "Se o significado era um produto passageiro das palavras ou dos significantes, sempre oscilante e instável, em parte presente e em parte ausente, como poderia haver qualquer verdade ou significação determinada? Se a realidade era antes construída do que refletida pelo nosso discurso, como poderíamos chegar a conhecer a própria realidade, e lugar de conhecer apenas nosso próprio discurso?' (p. 198).

Eagleton argumenta que o modelo de ciência positivista, frequentemente criticado pelo pós-estruturalismo, trata-se de um falso alvo, pois é uma caricatura da autorreflexão científica. "Dizer que não há razões absolutas para o uso de palavras como verdade, certeza, realidade e assim por diante, não significa dizer que lhes falte significado ou que elas nao sejam eficientes" (p. 199).

Além disso, acreditar que somos incapazes de apresentar razoavelmente certas pretensões de verdade porque elas são meramente relativas à nossa linguagem acaba por nos livrar de assumir posições em questões importantes, pois tais posicionamentos não passam de produtos passageiros do significante. Ao contrário do que considerava Bakhtin, não se trata da linguagem como "discurso"; a obra de Jacques Derrida é notavelmente indiferente a essas preocupações, e é daí que surge a obsessão doutrinária pela "falta de decisão".

"O significado pode não ter sido decidido, se adotarmos uma visão de linguagem contemplativa, mas ele passa a ser DECISÍVEL quando pensamos na linguagem como algo que fazemos, inseparavelmente ligada às nossas formas práticas de vida, e assim palavras como verdade, realidade, conhecimento e certeza reconquistam sua força" (p. 202).

O propósito de Derrida com a desconstrução, enquanto prática política, era de desmontar a lógica pela qual um sistema particular de pensamento e todo um sistema de estruturas políticas e instituições sociais mantêm sua força. Não se pode, então, rejeitar o pós-estruturalismo como um simples anarquismo ou hedonismo; ele teve razão ao censurar a política ortodoxa da esquerda de sua época por ter falhado.

Em fins da década de 1960 e princípios da década de 70, começavam a surgir novas formas políticas cuja Esquerda tradicional tentou reduzir a importância, ou absorvê-las como partes subordinadas de seu próprio programa. Essas formas políticas ainda são questões que, além das injustiças econômicas e materiais, engajam as mais profundas dimensões pessoais da vida humana. "A política cega à experiência humana, do sujeito humano, era incompleta desde o início. A passagem do estruturalismo ao pós-estruturalismo foi, em parte, uma reação a estas exigências políticas" (p. 205). Porém Eagleton ainda argumenta que a luta política não deve ser reduzida ao pessoal, e vice-versa.