“Teoria da literatura”, Terry Eagleton
A fenomenologia trata dos fenômenos como apreendidos pela consciência, e através da redução fenomenológica busca suas essências – é uma ciência da própria subjetividade: o mundo é aquilo que postulo. Na visão de Husserl, o significado é anterior a linguagem, e esta somente dá nomes a significados de que já disponho. No entanto, com a virada linguística, ficou reconhecido que o significado não é apenas algo “expresso” ou “refletido” na linguagem, mas sim produzido por ela. Só podemos ter significados e experiências porque temos uma linguagem na qual eles se processam.
A visão de Husserl era essencialista, pois fixava os significados numa essência. Heidegger foi seu discípulo mais conhecido, porém reconhecia que o significado era histórico. Ele era considerado mais um existencialista, e via a história como um processo particular, subjetivo, e não como a História.
A hermenêutica de Hirsch também foi influenciada por Husserl, mas ele admite que uma obra pode significa coisas diferentes para cada pessoa em cada momento histórico, ressaltando que essa seria uma questão de significação, e não de sentido, pois este pertenceria somente ao autor, o que não deixa de ser uma visão essencialista.
Ainda quanto à fenomenologia, Husserl é seu fundador, e suas bases são a redução fenomenológica (para chegar à uma essência) e a abstração eidética (essência universal do que é intuído no ato da percepção). Pelo fato de serem intuídos, autoritariamente dependentes da intuição, os fenômenos não precisam ser interpretados ou construídos numa argumentação racional. “Ser” e “significar” estão atados um no outro, pois para ele não há objeto sem sujeito nem sujeito sem objeto: são duas faces da mesma moeda.
A fenomenologia reduz o mundo exterior ao conteúdo da nossa consciência, mas defende um retorno ao que é concreto, “de volta às coisas em si!”. Husserl crê que a consciência não é falivelmente empírica apenas, mas também TRANSCENDENTAL, reestabelecendo a centralidade do sujeito humano, que é fonte e origem de todo significado. Em certo sentido, ele recuperou e reformulou o velho sonho da ideologia burguesa clássica: a crença de que o homem era anterior à sua história e suas condições sociais, sem examinar se esse homem poderia ser produto de condições sociais, bem como produtor delas. Esta questão não era levada a sério pela fenomenologia dele, que isola o objeto de suas condições sociais, de seu contexto histórico.
Enquanto crítica literária, a fenomenologia busca obter a total objetividade e o completo desinteresse. Para Husserl, o significado antecede a linguagem, como se esta fosse uma atividade secundária que dá nomes a significados já dispostos. Eagleton critica que ele defende uma esfera de experiência puramente particular ou interna, o que é uma ficção, pois toda experiência envolve a linguagem e ela é social.
P.S.: A virada linguística do século XX é o reconhecimento de que o significado não é apenas alguma coisa “expressa” ou “refletida” na linguagem, mas é, na realidade, produzido por ela. Só podemos ter significados e experiências porque temos uma linguagem na qual eles se processam. Os significados humanos são históricos, não constituem uma intuição da essência universal, mas uma questão de relações práticas entre indivíduos sociais.
Há também a fenomenologia social, de Schultz, que influenciou Habermas...
“A Teoria da Comunicação de Alfred Schutz”, João Carlos Correia (Introdução)
Schutz incorporou o mundo da vida cotidiano na investigação sociológica, abrindo a porta para a possibilidade de articular os estudos dos sistemas e das instituições e os incipientes estudos das relações face a face. Foi um dos primeiros pensadores a reivindicar como objeto de estudo o âmbito da “sociabilidade”, ou seja, o conjunto de relações interpessoais e atitudes pessoais que, ainda que dependam de padrões adquiridos, são pragmaticamente reproduzidas ou modificadas na vida cotidiana. À luz de Schutz é possível perceber de um modo mais claro a atualidade da distinção entre sociologias compreensivas, nomeadamente as de inspiração fenomenológica, e as perspectivas mais acentuadamente marcadas pela herança de Durkheim. Do debate que ocorre no século XIX entre os pensadores que, à semelhança de Comte, Spencer e Durkheim, enfatizaram a autonomia da sociedade e a consequente subordinação do indivíduo a esta realidade sui generis, e os que, pelo contrário, entendiam que as ciências que se ocupavam das humanidades e da realidade sócio-histórica não poderiam usar um método semelhante aos das ciências exatas, surge, com especial contribuição dos segundos, uma concepção de sociologia particularmente baseada nas reflexões epistemológicas de Simmel e de Weber, que enfatiza a análise da ação social e do seu caráter subjetivamente significativo. “A sociedade é prioritária em relação ao indivíduo que separado do todo social não existe sequer? Ou devemos colocar o problema de um modo completamente diferente e dizer que o indivíduo existe por si só e que as organizações sociais, incluindo a própria sociedade, são meras abstrações – ‘funções’ do comportamento dos indivíduos separados entre si? É o ser social do homem que determina a sua consciência ou é a sua consciência que determina o ser social?’ (Schutz, 1967: 4).
Existe na obra de Schutz um equilíbrio que permite pensar na tentativa de fundação de um individualismo socialmente situado. Tal individualismo não significa um regresso a Hobbes e ao seu psicologismo individualista, nem a Descartes e ao seu sujeito pensador. A afirmação do indivíduo se faz no interior de comunidades, formas de vida e jogos de linguagem que, todavia, nunca são definitivos nem absolutos.
O objetivo da fenomenologia, tal como foi proposto por Husserl, é estudar os fenômenos tais como são experimentados na consciência através de atos cognitivos e perceptivos, tentando, deste modo, perceber como é que as pessoas constroem o significado. Apesar das dificuldades que Husserl teve em lidar com este fenômeno, para a Fenomenologia, a nossa experiência do mundo, na qual os pensamentos se fundam, é intersubjetiva porque experimentamos o mundo com outros e através de outros. Foi precisamente nesta parte do pensamento fenomenológico – a análise da dimensão intersubjetiva do conhecimento do mundo – que Schutz entendeu ser possivel e necessário ultrapassar as aporias do pensamento husserliano.